Pela primeira vez em quase 60 anos, lA�der mA?ximo cubano nA?o serA? um dos irmA?os revolucionA?rios. Apesar da ‘transiA�A?o geracional’, expectativa A� mais de continuidade do que de ruptura com governos anteriores.
Cuba anunciou seu novo presidente nesta quinta-feira (19):A�Miguel DA�az-Canel. OA�A?nico candidato indicado para aprovaA�A?o da Assembleia Nacional, como jA? se esperava, A� um discA�pulo de RaA?l Castro e construiu sua carreira polA�tica dentro do Partido Comunista Cubano.
Depois de quase 60 anos, pela primeira vez a ilha nA?o terA? um dos irmA?os Castro no comando: RaA?l Castro deixa a presidA?ncia 12 anos depois de substituir seu irmA?o mais velho, Fidel. DA�az-Canel, de 57 anos, serA? tambA�m o primeiro presidente de uma geraA�A?o posterior A� que vivenciou a RevoluA�A?o de 1959.
“A� a primeira vez que Cuba serA? presidida por um polA�tico que nasceu depois e nA?o pertence A� geraA�A?o guerrilheira. Alguns analistas acreditam que, por essa nova ‘geraA�A?o burocrA?tica’ possuir menos legitimidade, terA? tambA�m que criar mais mecanismos de gestA?o colegiada e negociaA�A?o entre os diferentes grupos que compA�em o Estado”, analisa a historiadora Joana SalA�m, doutoranda em HistA?ria na Universidade de SA?o Paulo (USP) e pesquisadora visitante da Universidade da CalifA?rnia.
“Essa transiA�A?o geracional pode criar um efeito descentralizador do sistema polA�tico, mas isso nA?o necessariamente serA? visA�vel ao observador externo, pois pode acontecer sem mudanA�as formaisa�?, afirma SalA�m.
Daniel AarA?o Reis, professor de HistA?ria ContemporA?nea da Universidade Federal Fluminense (UFF), acredita que nA?o se pode dizer que a “era Castro acabou”. Para ele, a oposiA�A?o ao governo de RaA?l ainda encontrarA? dificuldades, mesmo que a abertura econA?mica ganhe fA?lego.
“As oposiA�A�es continuam a ter vida dura em Cuba, sofrendo assA�dio permanente do governo e de sua polA�cia polA�tica, que se concretiza em pressA�es e mesmo prisA�es. A curto prazo, nA?o hA? perspectivas alentadoras para elas”, afirma.
O novo mandatA?rio prestes a assumir serA? o primeiro civil na presidA?ncia desde 1976, mas isso nA?o significa necessariamente uma mudanA�a polA�tica no paA�s. A trajetA?ria de DA�az-Canel se deu dentro do Partido Comunista de Cuba (PCC), sob a tutela de RaA?l Castro.
Ele nasceu em 1960, um ano depois da RevoluA�A?o, na provA�ncia central de Villa Clara.
Foi lA�der da uniA?o de Jovens Comunistas em sua provA�ncia e chegou A� lideranA�a da juventude nacional do Partido Comunista de Cuba em 1993.
Foi nomeado ministro do Ensino Superior por RaA?l Castro em 2009 e ficou no cargo durante trA?s anos. Em marA�o de 2012, foi nomeado vice-presidente do Conselho de Ministros para a CiA?ncia, EducaA�A?o, Esportes e Cultura, circulando nacional e internacionalmente, muitas vezes na companhia ou em nome de RaA?l Castro.
MetA?dico, DA�az-Canel cresceu na carreira polA�tica como um “funcionA?rio exemplar”.
“Ele A� um engenheiro que pensa em termos de eficiA?ncia, questionando-se qual A� o sistema que lhe trarA? mais resultados”, afirma o cientista polA�tico LA?pez Levy, contemporA?neo de DA�az-Canel, A� reportagem da BBC.
AarA?o Reis lembra que, embora DA�az-Canel seja um homem de confianA�a de RaA?l Castro e tenha uma trajetA?ria dentro do Partido Comunista de Cuba, ele nA?o pertence A� geraA�A?o revolucionA?ria e A� civil.
“Insista-se: ele A� um homem do sistema, mas hA? exemplos histA?ricos de ‘homens do sistema’ que se decidiram a mudar o ‘sistema’. Basta citar dois exemplos: Mikhail Gorbatchev e Deng Xiao-Ping. Embora provenientes do ‘sistema’, souberam encarnar propostas reformistas”, diz AarA?o Reis.
QuestA�es importantes com as quais o novo presidente terA? de lidar:
- DesestatizaA�A?o
Para a historiadora Joana SalA�m, os cubanos tA?m duas expectativas principais em relaA�A?o ao novo governo: primeiro, a desestatizaA�A?o da economia; segundo, a descentralizaA�A?o da polA�tica.
A�a�?Quando digo ‘desestatizaA�A?o’ nA?o me refiro ao neoliberalismo ou A�s privatizaA�A�es, como acontece no resto da AmA�rica Latina, mas sim a uma economia que deixarA? de ser 95% estatal para ser 70% estatal. O Estado cubano seguirA? sendo protagonista”, explica SalA�m.“Acontece que a abertura de 30% de setor privado faz uma grande diferenA�a na vida da sociedade cubana, que passa a criar pequenas e mA�dias empresas”, completa.
- DescentralizaA�A?o
A descentralizaA�A?o da polA�tica A� um ponto mais polA?mico. A Assembleia Nacional do Poder Popular A� formada por deputados com salA?rios prA?ximos da mA�dia salarial do povo, 40% sA?o negros e 53% sA?o mulheres, mas, em termos ideolA?gicos, a coisa muda de figura.
“HA? um predomA�nio absoluto de militantes do Partido Comunista (96%). Setores nA?o partidA?rios poderiam ter mais participaA�A?o. Existem grupos apoiadores da RevoluA�A?o, identificados com o socialismo, mas que defendem o fortalecimento dos organismos de base, como os Conselhos Populares, e a criaA�A?o de mais canais de representatividade e de debate pA?blico”, continua SalA�m.
A visA?o de DA�az-Canel sobre essa importante encruzilhada do regime cubano, no entanto, continua uma incA?gnita.
Para Antonio Rodiles, ativista anticastrista, DA�az-CanelA�“A� uma pessoa apagada, que repete como um robA? o que tem sido dito em Cuba nos A?ltimos 60 anos”.
- RelaA�A?o com os EUA
A aproximaA�A?o entre os dois paA�ses, movimento que vinha sendo implementado no governo Obama, foi freadoA�quando Donald Trump assumiu a presidA?ncia dos EUA. As embaixadas voltaram a se instalar em Havana e Washington, e Obama chegou a visitar Cuba em 2016, reduzindo a tensA?o de dA�cadas entre a superpotA?ncia capitalista e o pequeno enclave socialista situado a poucos quilA?metros de sua costa.
O futuro, porA�m, depende muito mais do governo americano do que de Cuba.
“A abertura empreendida por Obama foi paralisada. Entretanto, Trump nA?o a reverteu. E A� do interesse de empresas americanas ganhar e consolidar acesso ao mercado cubano. Tudo isto estA? sujeito a ventos e a trovoadas”, comenta o professor AarA?o Reis.
“Mas uma coisa A� certa: um eventual endurecimento dos EUA sA? farA? o jogo dos conservadores cubanos que desejam manter como estA? uma ditadura polA�tica que jA? foi revolucionA?ria e que, hA? muito, se tornou basicamente conservadora”, completa.
Quando o novo presidente assumir, o caA�ula dos irmA?os Castro nA?o renunciarA? a todas as suas funA�A�es. Ele continuarA? atuando como secretA?rio-geral do Partido Comunista de Cuba atA� 2021, alA�m de seguir como deputado nacional e lA�der das ForA�as Armadas.
RaA?l sucedeu Fidel interinamente em 2006 e definitivamente em 2008, apA?s ser o nA?mero 2 durante os anos de governo do irmA?o mais velho.
Na RevoluA�A?o de 1959, RaA?l, sob a lideranA�a de Fidel, ajudou a derrubar o governo cubano comandado pelo ditador Fulgencio Batista. ApA?s a tentativa bem sucedida de tomar o poder na ilha, Fidel jA? anunciava que seu irmA?o caA�ula deveria ser seu sucessor. Meses depois, ele assumiu o posto de Ministro da Defesa.
InvasA?o da BaA�a dos Porcos e Crise dos MA�sseis
Em 1961, tropas cubanas lideradas por RaA?l conseguiram impedir a invasA?o da BaA�a dos Porcos por um grupo de paramilitares treinados pela CIA. A derrota dos EUA no episA?dio, que durou 4 dias, foi significativa para o estabelecimento do regime de Fidel.
Um ano depois, durante visita A� UniA?o SoviA�tica, RaA?l recebeu a promessa de que teria mA�sseis instalados em Cuba, o que acabou levando A� Crise dos MA�sseis. O conflito entre Estados Unidos e UniA?o SoviA�tica durou 13 dias e terminou depois que Kennedy, entA?o presidente dos EUA, concordou em retirar mA�sseis americanos da fronteira entre a Turquia e a UniA?o SoviA�tica.
Mais flexA�vel
Em outubro de 1997, o Partido Comunista definiu oficialmente que RaA?l seria o sucessor de Fidel Castro quando este tivesse que deixar o poder. Em 2006, Fidel precisou se afastar por causa de uma cirurgia no intestino, e RaA?l assumiu interinamente o comando da ilha.
Dois anos depois, RaA?l se tornou oficialmente o novo presidente de Cuba, apA?s Fidel renunciar devido A� saA?de jA? debilitada.
Desde entA?o, RaA?l se mostrou mais flexA�vel que o irmA?o e comandou pequenas mudanA�as na vida em Cuba, abrindo o paA�s para investimentos estrangeiros, empresas privadas e para a compra e venda de imA?veis. TambA�m permitiu viagens de cubanos ao exterior.
JA? na reta final de seu mandato, recebeu Barack Obama e retomou as relaA�A�es diplomA?ticas de Cuba com os EUA, apA?s 52 anos de embargo.
Foi casado por 48 anos com Vilma EspA�n, sua companheira de RevoluA�A?o que morreu em 2007. Ele tem trA?s filhas, incluindo a deputada Mariela Castro, e um filho, o influente coronel Alejandro Castro, nove netos e uma bisneta.
Brasil e Cuba
Durante o perA�odo de RaA?l Castro na presidA?ncia, a relaA�A?o do paA�s caribenho com o Brasil teve capA�tulos importantes.
Em 2014, a entA?o presidente Dilma Roussef participou da inauguraA�A?o do Porto de Mariel em Cuba. A obra foi feita com um emprA�stimo de US$ 802 milhA�es (cerca de R$ 3,1 bilhA�es) do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento EconA?mico e Social) com um prazo de 25 anos. A obra ficou a cargo da empreiteira Odebrecht na A�poca.
TambA�m durante o governo Dilma, Brasil e Cuba iniciaram a parceria do Programa Mais MA�dicos, que tem o objetivo de levar profissionais brasileiros e estrangeiros a A?reas carentes das periferias de grandes cidades e tambA�m para o interior do paA�s.
Por intermA�dio da OrganizaA�A?o Pan-Americana de SaA?de (Opas), Cuba enviou diversos profissionais para atuar como mA�dicos no Brasil, inicialmente com contratos de trA?s anos. O governo de Michel Temer deu continuidade ao programa em 2016, sancionando uma lei que prorrogou o projeto por mais trA?s anos.
FONTE:G1