Não informar à mulher sobre algum procedimento médico que será realizado, negar remédio para dor e cometer agressão verbal ou física são os principais abusos cometidos por profissionais da saúde durante o trabalho de parto.
No Brasil, uma em cada quatro mulheres sofre algum tipo de violência obstétrica nas redes pública e privada, de acordo com pesquisa da Fundação Perseu Abramo.
Segundo o analista de pesquisas Matheus Toledo, o estudo foi realizado em 2010. “Foram ouvidos 2.365 mulheres e 1.181 homens de todos os estados do País, em área urbana e rural, sobre a violência contra a mulher desde o pré-natal”. No espírito Santo, foram entrevistadas mulheres das cidades de Vitória, Cariacica e Cachoeiro de Itapemirim.
Para a doula Aline de Almeida e Silva, vice-coordenadora da Associação Capixaba de Doulas (Adoules), esse número pode ser ainda maior, pois a maioria das mulheres não sabem que sofreram uma violência ou naturalizam aquela atitude como algo rotineiro.
“A violência obstétrica é todo o procedimento que tira o protagonismo feminino e invisibiliza a mulher. Existem processos que realmente são necessários e devem ser tomados em determinado momento, mas a violência é caracterizada pela apropriação do corpo da gestante sem uma evidência científica”, explicou.
A doula contou que a agressão verbal é considerada a mais comum. “São frases e piadinhas que diminuem a mulher e promovem um julgamento da sua sexualidade, como ‘na hora de fazer você não gritou’ ou ‘na hora de fazer tava bom’ e ‘se continuar gritando assim, vou te deixar aqui sozinha'”.
Ela avaliou que a episiotomia, que é o corte do períneo – região localizada entre a vagina e o ânus – é a principal violência física. “Esse procedimento continua sendo feito e ele pode gerar dormência no lugar da cicatriz e dor na hora da relação sexual. Empurrar a barriga da mulher na hora do parto, procedimento conhecido como de manobra de Kristeller, também continua acontecendo”.
Quem passou por isso durante os dois primeiros partos naturais foi a doula Stephanie Laport, de 31 anos. “Eu paguei um parto particular e achava que estava tendo a assistência adequada, mas fui submetida a procedimentos contra a minha vontade. Um enfermeiro pulou em cima da minha barriga e o médico cortou o períneo. Quando a neném nasceu, eu pedi para pegá-la no colo, porém, a médica negou. Fica um sentimento de mágoa. Há 10 anos, quase não se discutia isso, fui perceber que tinha sido violentada quando fiz o curso de doula”.
Denúncia
A Promotora de Justiça e coordenadora do subnúcleo de Enfrentamento às violências de Gênero em Defesa dos Direitos das Mulheres (Nevid), Cristiane Esteves Soares, informou que as mulheres podem fazer a denúncia por meio do 181 ou no Ministério Público do Espírito Santo (MPES-ES).
“Não existem um tipo criminal específico de violência obstétrica, mas como se trata de uma violência contra a mulher, se enquadra na Lei Maria da Penha como lesão corporal, injúria ou ameaça por parte da equipe médica”, explicou. Segundo a promotora, a maioria dos casos resultam em uma indenização para a vítima, com valores estimados com base nas consequências geradas para a mãe e até para o bebê.
“Depois que ela percebe que foi vítima de violência, deve denunciar. O ideal é que a mulher tenha uma testemunha, como o acompanhante do parto. O prontuário médico também contém informações que podem ser usados como prova”, indicou.
Questionado se há casos sob investigação de mulheres que sofreram violência obstétrica no Estado e se alguma foi indenizada, o Ministério Público não respondeu à demanda até a publicação desta reportagem.
Fonte: Tribuna Online